Há alguns anos atrás, na ilha de S. Miguel, estava deitada uma rapariga de vinte quatro anos; numa noite da semana santa, quando ouviu tocar a campainha do apregoador das almas. Sentou-se logo na cama para rezar, pois sabia que todo aquele que ouve lembrar as almas deve rezar sentado na cama ou de joelhos. Depois levantou-se e foi para a porta para ver o que se passava.
Olhando para o canto da rua, viu chegar uma procissão de almas e reconheceu uma parente sua que tinha morrido. A alma do familiar disse-lhe:
— O pequena, arrecolhe-te lá para dentro que a esta hora não se está à janela nem à porta. Hás-de dizer que não dêem as coisas por fazer, que aqui não há quem as faça. Aí vai a meada e o ano — e a alma atirou o que dizia.
A rapariga já tinha ouvido a outras pessoas que não era bom aparecer à janela nem à porta enquanto faziam aquela devoção, mas estava tão emocionada que pôs o xaile e saiu atrás da procissão das almas. Quando chegou à esquina da rua, viu a porta da igreja aberta e por lá entravam as almas. Continuou a andar, mas, quando começou a subir os degraus do adro, a porta fechou-se. Voltou para casa no momento em que os apregoadores das almas chegavam, cantando:
Ó almas, que estais aí
No Purgatório ardendo,
Cristão, ajudai as almas
Que elas estão padecendo.
Almas santas de Jesus
Que já fostes como nós,
Pedi por nós a Jesus,
Como pedimos por vós.
A rapariga deitou-se com algum nervosismo e não dormiu tranquila. Ao acordar, de manhã, contou o que tinha visto. No fim de três dias, morreu porque não devia ter dito nada a ninguém do que lhe tinha acontecido.
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